Automóveis e ser humano: afinidades e desafios

Você pode não ter parado para pensar, mas qual é a linha tênue que liga você ao seu automóvel? Bom, muitos poderiam responder rapidamente que tal linha é a mais primitiva possível, a linha do uso, do desfrute, da máquina à serviço do ser humano. Talvez, dentre muitas respostas possíveis, esta seria a mais coerente. Mas, olhando mais de perto, não é bem assim! Nossa relação com nossos Automóveis, essa tal linha que tecemos amarrações mais complexas. Não poderia deixar de recordar aqui a mudança no status de se possuir um automóvel. O que era para ser uma relação de uso da máquina passou por transformação que chega a agressão e morte. Não é novidade para ninguém saber que o trânsito mata mais pessoas do que a segunda guerra mundial. Neste caso, o automóvel deixou de ser um bem de serviço, de auxílio ao cotidiano de cada um de nós e passou a ser comparado aos equipamentos bélicos mais nocivos. É bem verdade que o automóvel mata. Outro aspecto dessa mudança acontece exatamente quando o mercado financeiro percebe que depois que o ser humano elegeu o automóvel como seu aliado para o enfrentamento do dia a dia, ele pode ser meio de produção e meio de lucro, de rentabilidade. Daí se deu aos veículos valores de mercado, que variam conforme ano, modelo, estado de conservação e etc. Ao associarmos o valor patrimonial aos veículos, eles entraram num outro status: o do poder! Nele, o carro serve para revelar de alguma maneira quem somos. Não deveria ser assim, mas é! Carros mais imponentes revelam pessoas mais necessitadas de imponência. Carros mais velozes revelam pessoas necessitadas de agilidade, de vencibilidade, etc! Carros populares já nem precisam mais de esclarecimentos, em sua própria produção, já se destacou a que veio e a quem veio. Aos mais populares! Enfim, no carro se mostra facetas que compõe a personalidade de cada um de nós. Nesse universo de possibilidades de ganho financeiro, entra a tecnologia aplicada. Hoje quase a maioria das pessoas que possuem automóveis sofisticados, não conseguiram explorar todo o conforto aplicado pela tecnologia ao veículo. Cada vez mais temos opções à nossa disposição e não temos tempo para dela fazermos uso. Daí surge a pergunta: os carros terão também tantas funções como os aparelhos telefônicos? Você já percebeu que seu telefone também faz ligações? Nosso automóvel sofreria essa mutação de finalidade? Bom, isso só saberemos com o tempo. Por fim, o desafio de recuperar sempre o princípio de relação entre o ser humano e o automóvel é atual. Em todas as situações que deixaram de levar em consideração a relação de uso onde a pessoa tem seu valor e dignidade e a máquina é apenas o instrumento que pode elevar esses valores, tivemos resultados trágicos, seja com mortes em trânsito, seja com auto-desprezo do próximo, seja com a inversão de finalidades onde o carro tem maior valor do que quem pode lhe possuir. Fica aqui a pergunta para pensarmos na educação dos próximos proprietários de veículos: qual relação estabelecermos com esse bem que parece perdurar nos próximos séculos?